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terça-feira, 14 de janeiro de 2020

CRÍTICA | Tom na Fazenda

CRÍTICA | Tom na Fazenda


Tom na fazenda foi idealizado pelo ator e produtor Armando Babaioff, que também assina a tradução da peça Tom à la Farme, do autor canadense Michel Marc Bouchard, cuja montagem nacional é dirigida por Rodrigo Portella.

É uma peça teatral que nos leva a refletir sobre tolerância e aceitação de outro ser humano. A temática LGBT aborda a ignorância pessoal ao lidar com o preconceito, a impotência, a violência e o fracasso.

O publicitário Tom (Armando Babaioff) vai à fazenda da família para o funeral de seu companheiro.  Ao chegar, descobre que a mãe do seu amante (Kelzy Ecard) nunca tinha ouvido falar dele e tampouco sabia que o filho era gay. Nesse ambiente rural e austero, Tom é envolvido numa trama de mentiras criada pelo truculento irmão Francis (Gustavo Vaz) do falecido, estabelecendo com aquela família relações de complicada dependência que me fez lembrar a síndrome de Estocolmo. A fazenda, aos poucos, vira cenário de um jogo perigoso, onde quanto mais os personagens se aproximam, maior a sombra de suas contradições. Com o passar do tempo somos apresentados a Sara (Camila Nhary) que vem para compor e equilibrar com um tom de comédia, aliviando a tensão tão presente.



Minha Crítica:

Estamos já quase terminando 2018, com 2019 há pouco menos de 02 meses e ainda vivemos questões que foram tabus desde de que o mundo se deu conta da existência de pessoas que sentiam e amavam de formas diferentes das delas.

Eu fui impactada por essa peça, não posso dizer qual foi o primeiro gatilho que disparou em mim sentimentos de raiva, de dor, de impotência. Talvez tenha sido a violência explicita e imposta a outro ser humano por sua orientação sexual ou a maneira em que a peça revela que o ditado ‘o pior cego é aquele que não quer enxergar’ seja o que deveria estar estampado em determinados lares, que insistem em ignorar aquilo que já esta evidente. Talvez ainda a forma chocante em que o preconceito viola e machuca de todas as formas possíveis, sejam elas física ou emocionalmente, e como isso tem o poder de te escravizar, de te fazer não ser.

Na plateia ouvia-se risos, mas era um riso de nervoso, como que para disfarçar o medo, como se pudesse com ele afugentar a dor. Mas não se pode nem com mil risadas sequer abafar a mensagem que a peça grita:

Os homossexuais aprendem a mentir antes mesmo de aprender a amar

No meio de segredos e mentiras temos uma mãe que precisa ser protegida da verdade, e nos faz pensar até que ponto a verdade deve ser escondida. Há também um irmão que sabe, mas não aceita; e o tamanho do seu preconceito só não é maior que a sua violência.

O espectador observa essas escolhas sobre a crescente atração sexual e a negação dela, sobre sonhos, sobre os erros cometidos e por vezes repetidos, sobre verdades X mentiras, sobre o que queremos saber ou ignorar e que caminho tomaremos após vivenciarmos tudo isso. Contudo, não julguem esse drama de forma leviana. Apesar de tudo, podemos perceber o amor, a força de quebrar as correntes do preconceito e de viver.

Eu tentei de todas as formas adivinhar o final, mas foi em vão.Em nenhuma das minhas previsões eu cheguei perto do desfecho trágico, surpreendente visceral e real. A ausência de um cenário mais elaborado é suprida pela atuação dinâmica e marcante dos personagens, deixando-os em evidencia constante.

Ao final, somos convidados a conhecer o texto em sua forma física. A luz se acende e vemos que fica em uma mesa, onde não há ninguém para te vigiar ou cobrar. Quem quiser e só se dirigir a ela, pegar o livro e deixar o dinheiro dentro da caixa. Você pode fazer troco se necessário, ou até levar o livro e depositar o valor depois, porque, segundo Babaioff, “Temos que confiar nas pessoas”. Um gesto lindo e grandioso em um mundo de tão pouca ética e honestidade. Saber que alguém, mesmo sendo um desconhecido acredita em você não tem preço.

Tom na Fazenda está na sua 7ª temporada, ainda sem patrocínio e dando verdadeiro exemplo de resiliência. Parabéns por vocês existirem e persistirem!

O texto de Bouchard possui uma adaptação para o cinema lançada em 2013, com direção do canadense Xavier Dolan, que também interpreta o Tom no longa, além de Lise Roy como Agathe e Pierre-Yves Cardinal no papel de Francis. O filme não possui distribuição no Brasil.

Babaioff em seu discurso de agradecimento no 5º Prêmio Cesgranrio de Teatro, o levantou a frase “Amar sem temer” e comentou a boa aceitação dos questionamentos da peça. “A gente não pode subestimar o público achando que eles só querem ver um tipo de teatro” Essa é a frase emblemática, e eu não poderia deixar de terminar esse texto com ela:

AMAR SEM TEMER!

Por Jackelline Costa



FICHA TÉCNICA

 Texto: Michel Marc Bouchard

Tradução: Armando Babaioff

Direção: Rodrigo Portella

Elenco: Kelzy Ecard, Armando Babaioff, Camila Nhary, Gustavo Vaz

Cenografia: Aurora dos Campos

Iluminação: Tomás Ribas

Figurino: Bruno Perlatto

Concepção Sonora: Marcello H.

Preparação Corporal: Lu Brites

Hair Stylist: Ezequiel Blanc

Produção: Galharufa Produções

Idealização: ABGV Produções Artísticas

Próxima apresentação:

Curtíssima temporada - 01 a 16/02/2020
Sexta a domingo | 19:30h
Teatro Petra Gold - Sala Marilia Pera
Ingressos a venda.
Comprando seu ingresso antecipado, até a data da estreia, você tem 30% de desconto na inteira e 15% na meia-entrada.
Link para compra de ingressos antecipados: https://bileto.sympla.com.br/event/63904/d/78907


Esta resenha foi originalmente postada pelo site Cultura&Ação
http://culturaeacao.com/?p=2117

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